O equilíbrio do dualismo humano


  É muito interessante como a psicologia e a filosofia servem de bases para o conhecimento humano em sua forma mais fundamental. Ainda outro dia estava relendo um livro de Jung que aborda o fato de que nós humanos somos dualistas e, falando a grosso modo, formados de uma parte boa e outra ruim, sem que uma seja necessariamente proporcional a outra.
   A figura do Yin e Yang ilustra muito bem esse conceito, pois demonstra, com a sua metade negra, o principio do mal presente em nós (ou instinto animalesco). E com a sua metade áurea, o principio benéfico (ou moral) que devem estar em equilíbrio. Um não pode suprimir o outro, e quando isso ocorre surgem as neuroses.
   Em um trecho do livro Psicologia do Inconsciente, Jung discorre, de forma muito concisa, este processo dualista que é inerente a nossa espécie:

"Não resta a menor dúvida de que isso nos
proporcionou uma visão de algo verdadeiro que o nosso orgulho, a nossa
consciência cultural, talvez não quisesse aceitar. Mas alguma coisa em nós
diz: sim, aceito. Muita gente acha isso irritante, protesta e, vendo o esforço
que isso requer, nem mesmo quer admiti-lo. O fato de o homem ter um lado
sombrio é terrível, convenhamos, pois esse lado não é feito apenas de
pequenas fraquezas e defeitos estéticos, mas tem uma dinâmica francamente
demoníaca. É raro que o homem, o indivíduo, saiba disso. Parece-lhe
inconcebível que possa, em algum ponto ou de alguma forma, exceder-se a
si mesmo. Mas se deixarmos que esses seres inofensivos formem uma
massa, em determinadas circunstâncias essa massa pode dar origem a um
monstro delirante. Cada indivíduo não passará, então, de uma célula
minúscula no corpo do monstro; querendo ou não, já não terá outro jeito
senão participar do desvario sanguinário da besta, apoiando-a na medida de
suas forças. Basta um surdo pressentimento dessas possibilidades do lado sombrio da humanidade para nos recusarmos a reconhecê-lo. Rebelamo-nos cegamente contra o dogma edificante do pecado original, que, no entanto, é incrivelmente verdadeiro. Sim, hesitamos até em reconhecer o conflito, que, no -entanto, se manifesta tão dolorosamente. É compreensível que uma orientação psicológica que insista no lado sombrio não seja benvinda e até nos amedronte, pois nos obriga a um confronto com um problema insondável. Temos uma secreta intuição de não estarmos totalmente isentos desse lado negativo e de que, pelo fato de termos um corpo, este projeta sua sombra — como todo corpo, aliás. Ela nos diz ainda que, se renegarmos nosso corpo, não somos tridimensionais, mas sim planos, ilusórios. Mas este corpo é um animal com alma, isto é, um sistema vivo, que obedece necessariamente ao instinto. Associando-nos a essa sombra, dizemos "sim" ao instinto e também àquela dinâmica fabulosa que ameaça por trás dela. A moral ascética do cristianismo quer livrar-nos disso e assim nos expõe ao risco de perturbar o mais profundo de nossa natureza animal."

  Na filosofia, o tão incompreendido (até por mim mesma) Nietzsche, desempenhou o seu grandioso trabalho, servindo-nos de exemplo vivo desta batalha campal entre estas forças ambíguas. Ele quis ensinar-nos, e o fez de forma extremamente clara, os riscos de se dizer sempre sim ao instinto.
 Em um pequeno trecho d o livro Assim falou Zarathustra, podemos ver a seguinte frase; "Tua alma morrerá mais depressa do que o corpo". E assim sucedeu com Nietzsche, que cedendo sempre aos impulsos do instinto, condenou sua moral ao perigoso cárcere que terminou por levá-lo a loucura.
 Assim, a nós mero mortais, resta-nos aprender com os exemplos e, apoiados na psicologia e filosofia, aspirar sempre o almejado equilíbrio interno, demonstrado na figura do Yin Yang, a fim de que não venhamos a sucumbir aos instintos, nem muito menos a moral ditatorial.

Escritora, fotógrafa e naturalista.

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